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2020 - 25 minutos
Dir. Giovanna Giovanini

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O cinema carrega uma herança histórica com a ideia do registro do trabalho, estando presente desde os primórdios com “A Saída dos Operários da Fábrica”, um dos primeiros filmes de que se tem registro. Aqui, alguém abre um portão de manhã e como a promessa de um novo dia de trabalho para o dono da “Banca Paraíso”, o filme começa. Em um dos primeiros diálogos do filme o proprietário afirma estar “trabalhando muito e ganhando pouco”, frase que ecoa pelo filme todo como o projeto neoliberal que deu errado.

O documentário é observativo, e por mais que a quarta parede se quebre em um ou dois momentos com a câmera sendo comentada pelos clientes, no geral ela se obscurece e os focos são a rotina de trabalho e as histórias contadas. Durante os dias, rostos claramente conhecidos passam e Seu Nenê trabalha até enquanto come, dizendo tirar apenas uma folga ao longo do ano, no Réveillon, demonstrando cansaço pela situação difícil de manter a banca, mas ao mesmo tempo a impossibilidade de imaginar um futuro melhor no país. Nas revistas há uma pluralidade de ideias, um “basta” referente ao presidente aparece na capa de uma, em outra são anunciadas novas armas de fogo, numa terceira, a situação de trabalhadores levados à exaustão é anunciada.

Nesse sortimento de informações que mais parece fomentar a desinformação do que de fato levar à uma objetividade, começa a ser comentado por entre os clientes o início de uma pandemia que mudaria radicalmente a relação de Seu Nenê com sua banca e seu trabalho. Milhares de negócios só em São Paulo faliram por decorrência da quarentena, a imprevisibilidade dessa situação acaba transformando o dispositivo fílmico em um documento preciso de como nossa nação lidou com a situação e como um serviço que fundamentalmente depende de pessoas na rua foi afetado. Em um momento um químico autodidata proclama a ineficácia total do álcool em gel e um cliente se recusa a acreditar que já tenha um caso confirmado no Brasil, uma imagem irônica de mentiras sendo comentadas em um lugar que deveria servir para o contrário, mas a banca acaba parecendo mais um lugar de encontro, troca de ideias e outros serviços.

O movimento claramente diminui e após passar um dia sem ganhar nada, Seu Nenê afirma estar pensando em aproveitar o momento para vender a banca, mas que não tem como ficar sem trabalho e uma revista atrás dele ilustra a conversa com uma capa contemplando o sonho da “vida sem chefe”. Por mais que não tenha movimento e que seus amigos digam que ele deveria descansar, continua trabalhando, o começo do filme em que comia enquanto atendia os clientes agora parece distante e seu nenê cochila sentado enquanto trabalha. Os dias passam, a chuva vem e vai, as noites chegam e os clientes não aparecem. Os planos repetitivos com as linhas retas e as formas quadradas reiteram a monotonia daquela rotina. Ao fim, seu nenê fecha sua banca, sugerindo ao mesmo tempo o fim do filme e o fim de um dia de trabalho, ação que novamente remete aos Irmãos Lumiére e à uma ideia cíclica, o que vimos na verdade é só um pedaço do cotidiano, e amanhã de uma forma ou de outra o portão será aberto de novo.